sexta-feira, 24 de maio de 2013

O amor não envelhece.


Ultimamente, tenho participado de algumas atividades beneficentes destinadas principalmente a idosos, em asilos carentes da periferia de São Paulo, são em torno de 10 asilos que visitamos em forma de revezamento, 1 por mês. Levamos um pouco de comida, fraldas e alguns produtos de higiene, de acordo com a necessidade de cada lugar. Entre amigos, fizemos uma campanha de arrecadação de fraldas geriátricas muito bacana, um detalhe muita gente nem lembra que existe, mas faz muita diferença no dia-a-dia  da vida destas pessoas
Mas o principal, e sobre o que eu quero falar , não é sobre os bens materiais que levamos. O mais importante, são os ouvidos e olhos para fazê-los sentirem-se especiais novamente
A Dona celeste tem 84 anos. Casaco cor do céu, óculos redondos e boca pequena, o que não impede de distribuir palavras doces e sorrisos tímidos. Ela tinha 2 filhos, 5 netos e 5 bisnetos. Seus olhos brilham quando fala deles. Infelizmente, sua filha mais velha morreu agora em outubro, com 70 anos. Sim, ela teve a primeira filha quando tinha apenas 14 anos, uma criança. Imagina quantas histórias bonitas, ou nem tanto, ela ainda tem pra contas, esperando apenas que alguém se interesse e guarde 20ou 30 minutos ao seu lado para ouvir “A gente fica tão feliz quando vocês vêm aqui” disse ela. A gente também fica Dona Celeste.
O Wilson é mais novo, 63anos. Homem forte sereno, olhos grandes e redondos. Lúcido e atento trabalhava como segurança de um famoso empresário de cantores. Durante 20 anos, protegeu e abriu espaço nas ruas e entradas de shows para o Roberto Carlos, Ney Matogrosso -seu preferido, Rita Lee, Caetano Veloso, Gal Costa, RPM, e mais um monte de artistas famosos. Gostava de viajar o Brasil inteiro. Tinha dias, que mal chegava à São Paulo e suas malas já estavam prontas pata outra viagem, nem saía do aeroporto. Eu falei pra ele que quando eu cantava aqui no escritório, o pessoal ficava tirando um sarro e pedindo pra eu parar. “Wilson, da próxima vez eu vou chamar você lá no escritório pra fazer a segurança pra mim”   Aí, ele deixou a serenidade de lado e sorriu como criança que acaba de fazer um gol.
O Seu Ernesto é descendente de alemães. Tem 68 anos, e garante que estava no asilo apenas como visitante e não mora lá. Muitos deles têm esta impressão ou sensação. Eu diria que é uma proteção sobre sua realidade. O Ernesto, muito simpático, tem um sorriso fácil e brilho nos olhos. Cabelo curto, meio grisalho, olhos semicerrados quando sorri. Era tradutor técnico em alemão, ainda trabalha, mas perdeu mercado por causa dos tradutores da internet. “Aí, todo mundo acha que sabe fazer tradução” Em casa, desde criança, a família só falava alemão, então foi fácil e natural. Agora o tempo andou, e ele só estava de visita, talvez este fosse o caminho para poder sorrir o dia inteiro em lugares que, apensar de todo o cuidado e dedicação dos mantenedores, carecem de encontros, toques e abraços.
Foi uma tarde que passou rápida. Muitos outros estão lá, fora de lá, espalhados pelo mundus todo, ou em nossas próprias casas, a espera de um olhar, um abraço, um ouvido, um entendimento, Às vezes a gente pensa que porque as pessoas perdem a capacidade motora, elas perdem a capacidade de sentir pensar e amar.
No fundo, quem perde somos nós que deixamos de acreditar nelas.
[Maurício Simões também vai envelhecer e vai precisar do seu abraço.]


quarta-feira, 15 de maio de 2013

Do que vou sentir falta de São Paulo


Daqui a alguns meses, depois de 33 anos morando em São Paulo, me despeço, temporariamente. O fato de, nesse tempo todo, eu nunca ter saído da cidade por mais que algumas semanas diz tanto sobre a minha preguiça para mudanças quanto a incrível quantidade de oportunidades, em todos os aspectos da vida, que encontrei aqui. É bastante fácil não gostar de São Paulo, sobretudo pela maldita trindade poluição / violência / trânsito; amar a cidade leva muito tempo, o suficiente para desenvolver certo senso de resignação e esquecer que existem lugares melhores no mundo (e, de qualquer maneira, o Tejo é belo, mas não é o rio que passa por aqui). Abaixo uma lista meio preguiçosa das coisas das quais acho que vou sentir saudades no próximo par de anos:
 
- Pastel de feira, clichê entre os clichês, mas minha comida de rua preferida do mundo todo. Mais ainda por, geralmente, carregar um gostinho de subversão, por estar se entupindo de massa frita, carne moída e queijo derretido antes de colocar qualquer outra coisa no estômago no dia (aliás, pastel existe em três sabores: carne, queijo e palmito. As demais variações são perversões desnecessárias do conceito). Feira livre também é uma delícia, mas esta tem equivalentes fora daqui (infelizmente não necessariamente com vendedores tão bem humorados).
 
- Poder beber na rua, sem necessidade de esconder a lata ou garrafa em um ridículo saquinho de papel. Poder comprar bebida a qualquer hora, em qualquer lugar, privilégio que muitos habitantes de paraísos da liberdade no mundo não têm. 

- Os shows do SESC. O modelo do SESC tem muito do que detesto no Brasil, sustentado por contribuições compulsórias e regressivo por natureza. Nesse caso, porém, vou ser egoísta e julgar pelos resultados, não pelo princípio. Como acho que ouvir música ao vivo é das atividades mais sublimes a que podemos nos dedicar, devo muitos dos pontos altos da minha vida ao SESC. Lá vi Banda Mantiqueira, Paulo Vanzolini, Paulinho da Viola, Ornette Coleman, Christian Scott, Chris Potter, Andre Mehmari & Hamilton de Holanda, Hermeto Pascoal, Yusef Lateef, Rosa Passos, etc, etc, etc; tudo barato, organizado, com ótima infraestrutura e em horários decentes. Civilização deve ser algo desse tipo.

- Os botecos, lugares mágicos onde o tempo se comprime e horas vão passando entre conversas sérias e reflexivas, discussões que nunca levam a lugar nenhum, bobagens irrepetíveis em outros ambientes, chopes, petiscos e talagadas irresponsáveis de steinhäger ou cachaça. Poucas coisas me deixam mais feliz do que reservar uma tarde e uma noite (e, possivelmente, a manhã seguinte, para lidar com a ressaca) para se dedicar a isso. Rei das Batidas, Zé Gordo, Pirajá, São Cristóvão, Empanadas, Frangó, Veloso, Zur Alten Mühle, Léo e aquele bar anônimo de esquina, que não fecha nunca e sempre tem cerveja gelada e uns petiscos meio suspeitos numa vitrine aquecida, um top 10 de coração.

- Andar na avenida Paulista, que pra mim segue sendo uma atração turística de primeira, dos melhores lugares que conheço para simplesmente ver gente (claro que também ajuda o monte de cinemas, livrarias, bares e restaurantes ao redor).

- Poder dirigir duas horas e meia (OK, com alguma sorte) e chegar às praias que são acompanhadas pela Rio-Santos. O litoral de São Sebastião a Ubatuba é magnífico, não deve nada a outros mais falados (mas não menos visitados). Concedo que também é ótimo poder pegar um voo de três quartos de hora e pousar no Rio de Janeiro, mas as saudades do Rio eu deixo para outro texto.

- Por fim, acima de tudo isso, das paulistanas e paulistanos, porque não se sai de um relacionamento tão intenso de três décadas sem criar raízes. Imagine fazer todas essas coisas supostamente legais listadas aí em cima sem companhia - pior ainda quando olho para trás e vejo que tive a sorte de encontrar aqui gente tão generosa e interessante, disposta a compartilhar de sua alegria de viver. Este humilde texto é, no fundo, uma homenagem a todos vocês.


Luciano Sobral - Trabalha como economista para financiar a humilde missão de conhecer o mundo

quinta-feira, 9 de maio de 2013

A Milha e os Limites do possível.

2ª feira agora fez 59 anos que caiu uma das maiores barreiras da história do esporte. O britânico Roger Bannister foi a primeira pessoa a correr 1 Milha (1609m) em menos de 4 minutos. Vem de longe essa paixão do simbolismo dos números cheios nas mais diversas atividades. No atletismo não é diferente. A fixação por esta marca levou por décadas centenas de corredores a tentar superá-la e entrar na história.
Hoje pode até causar estranheza o porquê tanta atenção tenha sido dedicada à busca, mas no começo do século passado matemáticos diziam ser impossível, treinadores diziam ser sobre-humano e médicos diziam que o coração humano simplesmente entraria em colapso correndo nesse ritmo.
Foi a coincidência que fez ainda com que uma semana atrás o americano de número 400 quebrasse a mesmíssima marca. Mais. No mesmo ano em que Bannister parou o relógio em 3:59.6, 37 (trinta e sete!) vezes outros atletas fizeram o mesmo. Dias depois do britânico, o recorde mundial já havia caído vertiginosamente. Por quê?
Às vezes, coisas tidas como impossíveis precisam se tornar tangíveis aos olhos de tantos outros pra que se crie a coragem necessária. Pode parecer clichê de filme de 2ª categoria, mas “por ele (Everest) estar lá”, alguém foi lá e fez. Ou ainda, “por não saber que era impossível, ele foi lá e fez”.
O melhor livro que reconta a saga de Roger Bannister, o The Perfect Mile, é primoroso ao retratar tão bem ainda a vida do americano Wes Santee e o australiano John Landy lutando na mesma época pela mesma quebra. No final de tudo, talvez seja inevitável que o autor queira nos fazer acreditar que tenha sido assim, você fica achando que a honra de entrar para a história tenha ficado com Roger não porque ele fosse o melhor atleta, mas porque ele mais do que ninguém tinha a certeza que correr abaixo de 4 minutos era possível. Assim no esporte, assim na vida?

Danilo Balu

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Dumbariboró...


O mapa digital, o mapa na mão, a revolução do ser errante.
Certa vez ouvi, não sei se em um boteco, em uma palestra, em uma aula ou em uma dessas madrugadas de puro “voyeurismo internético”:
“o nosso nível de felicidade já é e será cada vez mais regido pela aptidão de saber a dose e a forma certas de se relacionar com as maquinas...”.
Sei que esse tema já foi abordado por um colega desse blog, mas não me refiro à uma nova descoberta milagrosa de como obter felicidade ao alcance de seu iphone ou outro smartphone; ou da forma como dosar a sua vida pessoal (real) e sua vida no mundo virtual. Falo apenas da segunda maior revolução que esses espertos aparelhinhos nos possibilitam: Georreferenenciar o nosso caminhar!
Georreferenciar, provavelmente esse verbo não existe nos dicionários e meu corretor ortográfico tampouco o conhece, mas no meu meio de trabalho é um assunto recorrente; trata-se da arte de dar referencias espaciais a um determinado objeto, ou seja, atribui-se coordenadas geográficas, as velhas latitudes e longitudes da escola, lembram?
Há uns 20 anos apareceu um aparelhinho, GPS, que fornece as coordenadas de onde ele está, uma verdadeira revolução em muitas profissões, na Geologia de campo e nas navegações, nem se fale. Antes disso a definição de onde se estava e para onde se queria ir era feita com base em complicadíssimos cálculos geométricos com uso das estrelas, ou com um trabalho difícil de comparação entre um mapa topográfico (isso mesmo aquele das curvas de nível) e o relevo que estava ao seu redor (acreditem, não é fácil, e no tempo que eu estudei geologia os alunos aprendiam a fazer isso sem um GPS).
Aconteceu que hoje em dia, qualquer aparelhinho celular possui um bom GPS, e mais, você pode ver a sua localização sobre um belo mapa, ou imagem de satélite em aplicativos como o google maps, google Earth e muitos outros.
E no que raios isso revolucionou nossas vidas? Para quem trabalha no campo acredito que não preciso dizer, agora imaginem o tanto que comércios podem se beneficiar disso. Acredito que ainda veremos muitas novas ferramentas mas quem não virou dependente do google maps para chegar em qualquer lugar, e esses novos aplicativos para chamar taxi, e os mapas do céu ? as estrelas e seus nomes ao alcance de todos, facilitando e muito aquele velho xaveco romântico olhando pro céu. Mas a grande vantagem disso tudo acredito ser outra:
Gravar seus trajetos, ajudar nossa memoria que é tão carente de noção espacial, e nos mostrar onde foram tiradas as fotos, qual foi o caminho que o levou àquele restaurante maravilhoso. Isso com certeza ajuda muito a guardar mais sentimentos e sensações, ao ver seu trajeto, e visualizar o relevo, você se lembra de como estava cansado, do cheiro que sentiu a entrar na mata, da surpresa que teve ao atingir um mirante, aquele por do sol na praia...
Hoje fiz um belo passeio, aqui em BH, subi o parque das Mangabeiras, com direito a banho de cachoeira, vistas incríveis e um entendimento melhor da geografia  e geologia da cidade, que coisa maluca é uma cidade encostada na mata, numa serra resplandecente de onde se tira e se tirou muita riqueza, cidade erguida sobre as pedras que contem ferro. Um simples trajeto no google Earth me leva a vários pensamentos, a cidade, o poderio econômico, as rochas contendo ferro e seu belo relevo, e o contato com a natureza dentro da bela cidade, belas vistas, belas gerais.... e na chegada uma bela sardinha assada, que no vizinho só se assa no ultimo sábado do mês....

 
 
Caso alguém tenha interesse posso mostrar como se geram esses trajetos e como se exportam pro google Earth....vale perder uns minutinhos 
Belo Horizonte, capital do ferro, na borda do quadrilátero ferrífero em um 27 de abril ensolarado... †
 
Manuel Correa